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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Por que tanta indignação?

Ante o ocorrido recentemente na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, em que professores da rede estadual foram agredidos por policiais do Batalhão de Choque - presentes, olhem só!, para garantir a paz e a ordem (e, por que não dizer?, manter o status quo) -, em uma clara releitura do período ditatorial (ou, como pretendem alguns, da ditabranda brasileira), concluí simplesmente que o Exmo. Sr. Governador do Estado deu aos manifestantes apenas o que eles queriam. Afinal...
Quem conseguiria passar a vida em uma sala de aula, em condições insalubres, ensinando crianças malcriadas (e que chegam a proferir ameaças - algumas vezes cumpridas), armadas, desinteressadas, vítimas da sociedade e de sua própria família, que refletem seu desprazer e suas desesperanças no ambiente escolar? Os professores o fazem.
Quem conseguiria manter uma rotina estafante, bem superior às quarenta horas semanais da maioria dos trabalhadores brasileiros, trabalhando em dois, até três ambientes diferentes, para, aí sim, poder adquirir o seu próprio sustento ao final do mês - incompatível com a carga horária exercida? Os professores o fazem.
Quem conseguria ver o seu trabalho, essencial para o desenvolvimento da sociedade, ferramenta indutora do futuro da Nação (e do mundo), cada vez mais desprezado e desestimulado? Os professores o fazem.
Quem conseguiria aguentar calado a sociedade o culpando pela falha de outrem? Os professores o fazem - "a culpa desse menino ser assim é da escola, que não faz nada".
Ora, é fácil concluir, portanto, que os professores são masoquistas - e o Sr. Governador, tão atento aos anseios da sociedade que o elegeu como seu representante, deu aquilo de que eles tanto devem gostar: sofrimento.
É, Governador Cid, uma hora dessas, seus mestres em Sobral devem estar orgulhosos do seu antigo, mas eterno, pupilo.

Um mal súbito

Era uma fria tarde de outono – apesar de aquele vilarejo, nos cafundós, onde o Judas perdeu as meias, não fazer a menor ideia do que significavam duas dessas palavras, pois havia adotado um calendário diferente sobre as estações do ano, pelo qual reconhecia claramente as seguintes: quente, muito quente, seco e mormaço. No entanto, naquele dia, fazia frio e era outono (talvez para enquadrar a história nesse tipo de texto, porque coincidentemente sempre é assim).

Apesar de ser uma quarta-feira, Lurdinha vestiu a sua roupa dominical e saiu de casa. Não sem antes haver passado longas duas horas cumprindo o típico ritual feminino, que independe se na cidade ou no campo; se praticado por jovens, senhoras ou idosas; se dispendioso ou não; sempre acontece.

Enquanto se arrumava, pensava na efemeridade da vida. Quer dizer, pensava que a vida é um bicho estranho, mode que do jeito que vem, vai – pois, com certeza, efemeridade lhe pareceria mais como um palavrão. E pode acontecer com qualquer pessoa a qualquer momento! Imagina só, o Dudu!

Tá certo, ela não o conhecia bem; mas ele era vereador! Filho da Dona Carola, vizinho da Sebastiana, havia ajudado a construir a escolinha que os filhos do Dão, seu vizinho, haviam estudado. E, de repente, trabalhando, aconteceu aquilo – como era o nome? Enfarte. Infarte. Enfarto. É, era isso. Enfarto. Fulminante. Um negócio no coração - parou de bater de uma vez. Não teve jeito, ninguém conseguiu reviver o moço.

Tinha saído até no Jornal Nacional. Um feito inédito: era a primeira vez que Costela de Cobra aparecia para o resto do Brasil. Tudo por causa de Dudu e seu infarte fulminante.

Quando se despediu do Rambo, o vira-lata abanou seu rabinho e a seguiu. Como sempre, não a abandonaria. Suspeita-se que, por falta de outros afazeres, Rambo preferia acompanhar a sua dona. Comentários maledicentes asseveravam o contrário – ela é que não conseguia fazer nada sem seu Sancho Pança canino.

O vilarejo estava imerso em um caos silencioso. As crianças que estudavam faltaram à escola, as lavadeiras mantiveram os tanques vazios (enquanto se portavam como Lurdinhas), as fofoqueiras de plantão (as há tanto no meio citadino como no rural) postavam-se – e prostravam-se – às calçadas. Apenas os cabras da peste, com dez bocas para sustentar, continuavam preocupados com o roçado e o dicumê. Afinal, “besteira é essa de sair na televisão só por causa do dotô?” Oxe, e num é que todo mundo vai morrer um dia?

A verdade é que, quando o séquito passou, todo mundo parou: preocupados e despreocupados; crianças, jovens e velhos; homens e mulheres. Mas a parada foi momentânea, diferente da que vitimara Dudu: todos se puseram a acompanhar o cortejo, inclusive Lurdinha – que, não se sabe o porquê, estava taciturna, sorumbática. Macambúzia mesmo.

Fez questão de fazer a sua primeira e última homenagem ao defunto vereador, esperando três horinhas, junto com Rambo, na fila em frente à igreja. Calada, passou pelo caixão, cruzou seus olhos com os dele e, ao levantar a vista, não deu outra: apaixonou-se.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Em defesa do Fortaleza Esporte Clube


Sei que esse blog é para publicar apenas textos meus, mas gostei tanto desse (principalmente do começo), escrito por um ex-professor da faculdade, pai de uma amiga minha, que me senti no dever de compartilhá-lo.




Reflitam. Principalmente sobre a parte da hipocrisia. :)




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EM DEFESA DO FORTALEZA ESPORTE CLUBE:


ALGUMAS PONDERAÇÕES


Considerando o momento esportivo atual, em que se discute, com muita veemência e pouca reflexão, os episódios de domingo (18/09);


Considerando haver um evidente unilateralismo nas versões divulgadas, nacional e regionalmente, sobre tais episódios;


Considerando, enfim, as repercussões de todo o ocorrido,


CABE PONDERAR:


I) A TERRÍVEL HIPOCRISIA DO DEBATE EM RELAÇÃO AOS ASPECTOS MORAIS DOS EPISÓDIOS:


a) De fato, não se vai aqui sustentar que a Moral seja um elemento irrelevante. Muito ao contrário! Mas, moralidade só existe, se não se fizer concessões levianas. Assim, se eu prego moralidade para os outros, mas não a pratico, ou se fecho os olhos quando a conduta amoral me interessa, ou me beneficia, eu não passo de um hipócrita! A propósito: hipocrisia, é palavra de origem grega que, de acordo com os dicionários, significa vício de caráter manifestado por aquele que aparenta ser o que não é ou que diz sentir o que não sente... Em termos mais populares: fingimento! Esse é um dado a se considerar;


b) Quando, pois, se afirma aqui que o debate no plano moral é inadequado para a compreensão desse episódio, é que é necessário separar o joio do trigo: sim, é até possível que algumas das opiniões manifestadas sejam ditadas por preocupações morais legítimas com o esporte e com a justiça das competições, mas, não se pode esquecer que a maioria das opiniões externadas é absolutamente suspeita (torcedores de times locais adversários, torcedores do clube paraibano, “jornalistas” esportivos altamente comprometidos pela paixão por clubes rivais);


c) Não é jornalismo, mas sim “jornalismo” a opinião de repórteres que, durante a transmissão do jogo, evidenciaram aberta e descaradamente sua preferência por um resultado, como se ouve e vê no vídeo devidamente editado, aparentemente da TV Pajuçara, em que seus repórteres manifestam sua falta de isenção, torcendo pela eliminação do Fortaleza;


d) Isso fica mais evidente, ainda, quando se observa o silêncio desses “jornalistas” sobre a ilegalidade e o absurdo da anulação do gol legítimo do Guarani de Sobral (gol que teria abortado toda essa confusão) e, novamente, o silêncio sobre a possível existência de impedimento no gol do Campinense... Mas, há silêncios que falam, silêncios eloqüentes! E esse silêncio nos diz que há hipocrisia em todo aquele vídeo!


e) Como é também suprema hipocrisia (no plano local, em Fortaleza, Estado do Ceará) a gritaria por parte dos torcedores do time rival (alguns deles são tão irremediavelmente tolos, que chegam ao ponto de não pronunciarem o nome Fortaleza, optando por se referirem à “capital do Ceará” ). E falam em “vergonha”, prejulgando sem provas e esquecidos de seu passado sombrio. Basta recordar que, dos seus supostos títulos de campeão, nada menos que seis foram conquistados nos tribunais (pode-se até dizer que o grande craque da história desse time foi seu advogado...);


f) Aos hipócritas, as perguntas: por que não mencionam e não debatem os vídeos dos gols de Campina Grande? Por que não se referem ao fato de que o Campinense atrasou sua entrada no primeiro tempo? Por que se limitam a contestar as expulsões ocorridas no PV, mas não exibem o vídeo? Como esperar credibilidade? Esta última pergunta, aliás, bem poderia ser respondida por certos “jornalistas”....


g) Conclusão: se o que se pretende é um debate sério, a primeira coisa é abandonar o falso moralismo, moralismo de ocasião, moralismo seletivo, e partir para uma análise objetiva do jogo.


II) ANÁLISE OBJETIVA DAS CIRCUNSTÂNCIAS DOS DOIS JOGOS


a) Primeiramente, uma lembrança: futebol não é puro espetáculo de arte (embora a arte seja um de seus mais belos aspectos)... Futebol é competição e, também, meio de vida profissional! As duas partidas do domingo, em Fortaleza e Campina Grande, envolviam paixões e interesses, envolviam clubes que ou podiam alcançar importantes conquistas (CRB e Guarany) ou podiam sofrer terríveis reveses (Fortaleza e Campinense);


b) Esse é um dado essencial para se compreender o espírito dos atletas em campo, seus erros, suas atitudes equivocadas!


c) Ao longo da competição, muitas vezes a rivalidade ultrapassou o desejado e admissível: torcedores fazendo barulho à porta do hotel dos adversários, sites oficiais, ou não, acenando com provocações. Tudo isso entrou em campo no domingo passado, potencializado pelo drama final do rebaixamento e da classificação;


d) três expulsões aconteceram, nos dois jogos: em Campina Grande, um jogador do time de Sobral, e, em Fortaleza, dois atletas da equipe de Maceió. Pois bem: ninguém contesta a expulsão do atleta sobralense, até porque foi merecida, mas a cobertura da TV Pajuçara, cujo vídeo, devidamente editado, foi divulgado nacionalmente, grita a plenos pulmões que o CRB teria sido prejudicado, lançando suspeita sobre a arbitragem... Não mostram as cenas que justificaram as expulsões, porém! Não falam do prejuízo para o Guarany ante a anulação de seu gol legítimo! Apenas gritam e caluniam...


e) Não podem ser levados a sério.


f) Não podem querer que o tal vídeo seja um documento válido de prova.


g) Por que não ousam contestar a legitimidade dos gols do Fortaleza? Se não contestam, por que não reconhecem que a arbitragem não influiu no resultado? Por que não dizem que o Fortaleza teve uma penalidade máxima a seu favor não marcada? Por que não dizem que o goleiro do CRB defendeu uma outra penalidade?


h) Respostas: porque não é conveniente para a sua versão hipócrita dos fatos! Porque, assim, ficaria claro que, se houve erros de arbitragem, houve nas duas partidas; que, os jogadores do CRB, longe de entregarem o jogo, lutaram bravamente (embora estivessem, como todos os demais das quatro equipes, nervosos e preocupados com os resultados); porque o objetivo não é informar a verdade, mas obter algum tipo de proveito escuso...


i) O primeiro gol do Fortaleza foi normal, e não há edição de vídeo que falsifique esse fato. Feito o gol, os jogadores correram com a bola para o centro, felizes, mas conscientes de que não bastava: sabiam que, a qualquer momento, poderia haver uma notícia ruim vinda de Campina Grande: por exemplo, a anulação de um gol legal do Guarany ou a validação de um gol do Campinense (impedido ou duvidoso: não dá para ter certeza porque não houve interesse em exibir com detalhes as respectivas imagens...)


j) o segundo gol do Fortaleza foi normal, e não há edição de vídeo que falsifique esse fato. Novamente, os jogadores correm para o centro, com a urgência em recomeçar a partida, pois sabiam que o resultado ideal seria pelo menos quatro gols de diferença...


j) O terceiro gol do Fortaleza foi normal, e não há edição de vídeo que falsifique esse fato. Novamente a cena se repete: os jogadores (o valente Carlinhos Bala à frente) correm para o centro: recomeçar!!! Mas, agora, o momento já não era de felicidade: era de desespero, pois o gol do Campinense já era notícia (o que não era notícia – silêncio eloqüente! – era a anulação do gol legítimo do Guarany...)


l) E vem a polêmica: Carlinhos Bala faz um gesto significando o número 1 (um)... Com toda a sua “isenção”, gritam os hipócritas: pedia aos jogadores do adversário que facilitassem o jogo... Deixem, por favor, que nós façamos mais um gol...


m) Não destacam que o atleta tricolor, apressado em correr de novo para o centro do gramado, passa rapidamente pelos adversários e por seus próprios companheiros, em poucos segundos alcançando o grande círculo... É esse o comportamento de quem quer pedir algo tão importante? Não divulgam a versão do atleta, ou divulgam com ironia... Ignoram a versão crível, coerente, “redonda” como a bola e o círculo central em que Carlinhos Bala depositou a bola: “Passei correndo – diz o atleta – e sinalizando que só faltava um gol, porque durante toda a partida os jogadores do adversário (comportamento provocativo comum dentro do campo) nos esnobavam, dizendo que já estaríamos desclassificados e rebaixados...”


n) E não param os hipócritas e falsos jornalistas. Afirmam que um jogador do CRB ordena a seu goleiro: “Deixa fazer!” Leitura labial... É possível, embora o jogador esteja virando o rosto enquanto pronuncia as pretensas palavras... É possível, mas improvável. Por que deixar fazer? O que tem o Fortaleza a oferecer? Dinheiro? Quem ouviu qualquer insinuação dessas? Nem mesmo os tais hipócritas se atreveram a tanto (até porque, lamentavelmente, o Fortaleza não está bem financeiramente).


o) E vem, finalmente, o quarto gol! Impedido? Não! Feito com a mão? Não! Houve falta? Não! Gol normal, legal, suado, desesperado! Gol de garra, feito por atletas que, embora não sejam atletas de seleção brasileira, souberam honrar a camisa que trajavam e respeitar a torcida que os saudava!


III) Os aspectos jurídicos. Alguns lembretes (a alguns “juristas” de plantão, que esquecem que o ato de julgar requer isenção) e aos leigos (tocedores, jornalistas e “jornalistas”):


a) De acordo com o art. 5º, LV, da Constituição Federal, não se pode julgar sem ouvir a outra parte (audiatur et altera pars) e sem permitir a ampla defesa;


b) O ônus da prova (o encargo, a necessidade de provar) é distribuído, por lei, assim: ao autor, os fatos constitutivos do seu direito, e ao réu, os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor (art. 333, do Código de Processo Civil). Logo, ao Campinense cabe esse peso: ou prova, muito bem provado, sem margem para dúvidas, que o Fortaleza pediu e o CRB entregou o resultado, ou então não pode esperar sucesso nessa sua empreitada leviana.


IV) IDENTIFICAÇÂO DO AUTOR:


Sem procuração do Fortaleza, como torcedor (admito minha suspeição, mas espero o debate sério).


Fortaleza, 20 de setembro de 2011.


Fernando Negreiros


Procurador da República


Professor Universitário (Processo Civil e Direito Eleitoral)