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quinta-feira, 4 de abril de 2013

Colecionando vidas


Desde a infância, Santiago era um viciado em colecionar coisas. Tampinhas, álbum de figurinhas, bonecos... Teve uma fase que até namoradas Santiago colecionou! Mas, pra satisfação de sua mãe (e tristeza de Santiago), essa fase não durou tanto assim. As pessoas achavam que essa história de colecionar logo passaria, mas o que aconteceu foi exatamente o contrário: as coleções foram ficando cada vez mais sérias.
Até que, ao chegar à maturidade, Santiago passou a colecionar livros. E a dita coleção passou a ser séria. Catalogada, organizada em estantes por categorias, as categorias por subcategorias, as subcategorias por autores em ordem alfabética. E tornou-se permanente.
Santiago nunca mais se desfez da sua coleção de livros - ao contrário, encarregou-se de aumentá-la diariamente, indo todo santo dia à livraria que havia perto de sua casa. E não fez tanta diferença assim quando a livraria fechou: Santiago achou outra para substitui-la. O importante mesmo era comprar mais e mais livros.
Minto: na verdade, o importante não era só comprá-los, pois Santiago impunha-se como obrigação ler todos os livros que adquiria. Não queria só ter, queria ler. Então, o que parecia ser algo saudável (afinal, ler nunca é demais), passou a ser obsessão. Santiago obrigou-se a todo dia comprar novos livros, só sossegando quando os terminava. A vida resumiu-se a adquirir os livros e lê-los, em um círculo vicioso que inibiu a sua vida social e profissional.
Acontece que aquilo que para os outros era obsessão, para Santiago era uma simples rotina. Lia desde Platão e Aristóteles a Danielle Steel, passando por Machado de Assis, Shakespeare, Alexandre Dumas e, mesmo, Paulo Coelho. Todo dia, o dia todo, comprava um livro e lia algo novo. Montou uma biblioteca exageradamente grande, de fazer inveja mesmo à de Alexandria, organizadamente catalogada.
Até o dia em que sua coleção se completou.
Isso mesmo, não tinha nenhum livro que Santiago não tivesse já comprado. Assim, não lhe restou outra saída: foi encontrado três dias depois, pendurado no último degrau da escada de sua biblioteca. Em uma folha, no bolso de seu casaco, havia apenas uma palavra: fim.