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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Estelionato eleitoral

ESTELIONATO ELEITORAL

Tive que escrever isso. Meu dever cívico e minha formação jurídica, assim como, principalmente, os meus princípios e a preocupação com o futuro deste belo Brasil, obrigaram-me.

Sei que a reação não foi a mesma ao saber da candidatura de pessoas como Tiririca, Maguila, “cantores” como os do KLB (de onde?), Romário etc. Mas, no âmago, sei que muita gente vota neles por protesto; por identificação com seu ídolo; enfim, por “n” fatores. Alguns deles utilizam, inclusive, a própria ignorância para atrair o voto do eleitorado (“você sabe o que um deputado federal faz? Nem eu!”). No entanto, considero um verdadeiro estelionato eleitoral utilizar-se da falta de educação da grande massa para se promover.

A questão da pena de morte sempre foi objeto de discussão no seio da sociedade. Vez por outra acontecem crimes de grande repercussão nacional (talvez alimentada por uma mídia sedenta por audiência) que reacendem esse debate – mas que sempre chega à mesma conclusão: manutenção do status quo. Por quê?

Poderia passar linhas e linhas copiando doutrinadores, falando em juridiquês, discorrendo acerca da finalidade da pena, do ordenamento jurídico brasileiro etc. Entretanto, este texto objetiva alcançar a maior parcela da sociedade, aquela fração ignorada durante três anos e lembrada tão-somente no período eleitoral, os ignorantes na acepção conotativa do termo – razão pela qual deixo termos técnicos para congressos e trabalhos científicos.

Antes de mais nada, gostaria de lembrar ao Sr. Candidato que o Brasil é um dos signatários do Pacto de São José da Costa Rica, que proíbe seja instituída a pena de morte nos países que já não a permitem – como o Brasil, que somente a permite em situação excepcionalíssima: guerra declarada.

Além disso, a proibição da pena de morte é uma cláusula pétrea (perdoem-me, às vezes recorrerei ao abominável juridiquês), significando que não pode ser, sequer, objeto de emenda constitucional que tenha a intenção de aboli-la. Ou seja, a pena de morte fora da situação supracitada (guerra declarada) não pode ser instituída nem mesmo por Emenda à Constituição, que exige requisitos rígidos para a sua aprovação.

Desse modo, a pena de morte somente poderia ser instituída no Brasil através de uma nova Constituinte, que definitivamente “rasgasse” a Constituição-Cidadã (CF/1988) – ainda assim, ignorando-se o já citado Pacto de São José da Costa Rica, o que acarreta sérias consequências para os relacionamentos internacionais do Brasil.

A proposta do Sr. Candidato diz que pretende “criar” a pena capital por meio de iniciativa popular. Calma, calma. Esse é um dos maiores absurdos que já vi um profissional do Direito comentando. Iniciativa popular para um tema que só poderia ser inserido (ainda assim, repita-se, rasgando o Pacto de São José da Costa Rica) mediante uma nova Constituinte? Não dá!

Ainda me esqueci de um fato primordial: ele é candidato a Deputado Estadual. Estadual! Querendo mudar a Constituição Federal, por meio de iniciativa popular, para criar pena de morte, utilizando-se da ignorância do povo, rasgando o Pacto de São José da Costa Rica... É demais!

O povo exige uma aplicação mais dura da lei em resposta à escalada criminosa na sociedade – mas a pena de morte não pode, de forma alguma, ser instituída no nosso ordenamento jurídico. É uma lástima que um profissional do Direito, utilizando-se da comoção social, procure aproveitar-se de um argumento falacioso com o único fim de ser eleito.

Sr. Candidato, tenho certeza que a sua formação jurídica não o ensinou a agir de tal forma. Abandone o pleito ou, pelo menos, tenha a decência de abandonar a sua principal proposta de campanha. Assim, talvez, poderemos ver quais são suas outras propostas para o Legislativo Estadual.

Rafael Caneca,

16/09/2010.

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